A Segunda Excursão de Predicação
Introdução
A Segunda Excursão de predicação pública da Galiléia começou no
domingo 3 de outubro do ano 28 d.C, e continuou por quase três meses,
finalizando em 30 de dezembro. Jesus e seus doze apóstolos estavam participando
neste esforço, assistidos pelo grupo recém recrutado de 117 evangelistas e por
outras numerosas pessoas interessadas. Nesta excursão eles visitaram Gadara,
Ptolemaida, Jafia, Daberate, Megido, Jezrael, Escitópolis, Tariquéia, Hipos,
Gamala, Betsáida-Júlia, e muitas outras cidades e povoados.
p1668:2
149:0.2 Antes da partida neste domingo de manhã, André e Pedro pediram a Jesus
que entregasse as obrigações definitivas para os novos evangelistas, mas o
Mestre recusou, dizendo que não era de sua incumbência fazer aquelas coisas que
outros podiam executar aceitavelmente. Depois da devida deliberação, foi
decidido que Tiago Zebedeu designaria as obrigações. Na conclusão dos
comentários de Tiago, Jesus disse aos evangelistas: «Saí agora a efetuar o
trabalho que vos foi encomendado, e mais tarde, quando hajais demonstrado vossa
competência e fidelidade, eu vos ordenarei a que prediqueis o evangelho do
reino.»
p1668:3 149:0.3 Nesta excursão, apenas Tiago e João viajaram com
Jesus. Pedro e os demais apóstolos levaram consigo cada um cerca de doze
evangelistas, e mantiveram um estreito contato com eles enquanto prosseguiam sua
obra de predicação e ensinamento. Tão logo os crentes estavam preparados para
entrar no reino, os apóstolos administravam o batismo. Jesus e seus dois
companheiros viajaram extensivamente durante estes três meses, visitando amiúde
duas cidades em um só dia para observar o trabalho dos evangelistas e para
encorajá-los em seus esforços por estabelecer o reino. Toda esta segunda
excursão de predicação foi principalmente um esforço para proporcionar uma
experiência prática a este corpo de 117 evangelistas recém instruídos.
p1668:4 149:0.4 Durante todo este período e posteriormente, até o
momento da partida definitiva de Jesus e os doze para Jerusalém, Davi Zebedeu
manteve um quartel general permanente para a obra do reino, na casa de seu pai
em Betsáida. Este era o centro de intercâmbio de informação para o trabalho de
Jesus na Terra, e a base das equipes para o serviço de mensageiros que Davi
mantinha entre os trabalhadores nas diversas partes de Palestina e regiões
adjacentes. Ele fez tudo isto por sua própria iniciativa, mas com a aprovação de
André. Davi empregou de quarenta a cinqüenta mensageiros nesta divisão de
inteligência da obra do reino que crescia e se expandia rapidamente. Enquanto
ocupava-se dessa maneira, ele ganhava parcialmente a vida dedicando uma parte de
seu tempo a seu antigo ofício de pescador.
A Extensa Fama de Jesus
p1668:5 149:1.1 Na época em que o acampamento de Betsáida foi
desmanchado, a fama de Jesus, em particular como sanador, havia se propagado por
todas as regiões da Palestina e através de toda Síria e os países limítrofes.
Durante semanas depois deles partirem de Betsáida, os enfermos continuaram
chegando, e quando não encontravam ao Mestre, ao saberem por Davi onde ele
estava, saíam em sua busca. Nesta excursão, Jesus não realizou deliberadamente
nenhum suposto milagre de cura. Entretanto, dezenas de afligidos recuperaram a
saúde e a felicidade como resultado do poder reconstrutor da intensa fé que os
impelia buscar a cura.
p1669:1 149:1.2 Por volta da época desta missão -
e continuou durante todo o resto da vida de Jesus na Terra -- começou a aparecer
uma série peculiar e inexplicável de fenômenos de cura. No decurso desta
excursão de três meses, mais de cem homens, mulheres e crianças da Judéia,
Iduméia, Galiléia, Síria, Tiro e Sidon, e do outro lado do Jordão, foram
beneficiários desta cura inconsciente por parte de Jesus e, ao regressarem às
suas casas, contribuíram para o aumento da fama de Jesus. E eles fizeram isto
não obstante Jesus, cada vez que observava um destes casos de cura espontânea,
ordenava diretamente ao beneficiário que «não contasse a ninguém.»
p1669:2 149:1.3 Nunca nos foi revelado o que ocorria exatamente nestes
casos de cura espontânea ou inconsciente. O Mestre nunca explicou a seus
apóstolos como estas cura eram efetuadas, exceto que em diversas ocasiões ele
simplesmente dizia: «Percebo que uma energia saiu de mim.» Numa ocasião ele
comentou quando foi tocado por uma criança doente, «Percebo que a vida saiu de
mim.»
p1669:3 149:1.4 Na ausência de uma explicação direta do Mestre
sobre a natureza destes casos de cura espontânea, seria uma presunção por nossa
parte tentar explicar como foram efetuados, mas é permissível que registremos
nossa opinião sobre todos estes fenômenos de cura. Cremos que muitos destes
milagres aparentes de cura, que ocorrerem no decurso do ministério terrestre de
Jesus, foram o resultado da coexistência das três seguintes influências
poderosas, potentes e associadas:
p1669:4 149:1.51. A presença de uma fé
sólida, dominante e viva no coração do ser humano que buscava insistentemente a
cura, junto com o fato de que esta cura era desejada por seus benefícios
espirituais, mais do que por um restabelecimento puramente físico.
p1669:5 149:1.62. A existência, concomitante com esta fé humana, da
grande simpatia e compaixão do Filho Criador de Deus, encarnado e dominado pela
misericórdia, que possuía realmente em sua pessoa poderes e prerrogativas
criativos de cura quase ilimitados e independentes do tempo.
p1669:6
149:1.73. Junto com a fé da criatura e a vida do Criador, também deve ser
assinalado que este Deus-homem era a expressão personificada da vontade do Pai.
Se, no contato da necessidade humana e o poder divino para satisfazê-la, o Pai
não desejava o contrário, os dois se faziam um, e a cura ocorria
inconscientemente do Jesus humano, mas era imediatamente reconhecida por sua
natureza divina. Assim pois, a explicação de muitos destes casos de cura deve
ser encontrada em uma grande lei que há muito tempo é conhecida por nós, ou
seja, Aquilo que o Filho Criador deseja e o Pai eterno quer, EXISTE.
p1669:7 149:1.8 É, pois, nossa opinião, que na presença pessoal de
Jesus, certas formas de profunda fé humana eram literal e realmente, poderosas
na manifestação da cura mediante certas forças e personalidades criativas do
universo que nesse momento estavam tão intimamente associadas com o Filho do
Homem. Portanto, é um fato registrado que Jesus permitia freqüentemente que os
homens se curassem a si mesmos em sua presença através da poderosa fé pessoal
deles.
p1670:1 149:1.9 Muitas outras pessoas buscavam a cura por motivos
totalmente egoístas. Uma rica viúva de Tiro veio com sua comitiva tentando ser
curada de suas enfermidades, que eram muitas; e conforme ela seguia Jesus por
toda Galiléia, ela continuou a oferecer mais e mais dinheiro, como se o poder de
Deus fosse algo para ser comprado pelo maior arrematante. Mas ela nunca ficou
interessada no evangelho do reino; apenas a cura de suas doenças físicas era o
que ela buscava.
A Atitude do Povo
p1670:2 149:2.1 Jesus compreendia a mente dos homens. Conhecia
o que havia no coração do homem, e seus ensinamentos foram deixados como ele os
apresentou, porque a explicação sendo apenas a interpretação inspiradora
proporcionada por sua vida terrestre, todas as nações e todas as religiões do
mundo abraçariam rapidamente o evangelho do reino. Os esforços bem intencionados
dos primeiros seguidores de Jesus por reformular seus ensinamentos afim de
torná-los mais aceitáveis para certas nações, raças e religiões, só tiveram o
resultado de tornar tais ensinamentos menos aceitáveis por todas as demais
nações, raças e religiões.
p1670:3 149:2.2 O apóstolo Paulo, em seus
esforços de levar os ensinamentos de Jesus à atenção favorável de certos grupos
de sua época, escreveu muitas cartas de instruções e recomendações. Outros
instrutores do evangelho de Jesus fizeram o mesmo, mas nenhum deles percebeu que
alguns destes escritos seriam reunidos posteriormente por aqueles que os
apresentariam como um arquétipo dos ensinamentos de Jesus. E assim, ainda que o
chamado cristianismo contenha mais do evangelho do Mestre que nenhuma outra
religião, ele também contem muitas coisas que Jesus não ensinou. Além da
incorporação de muitos ensinamentos dos mistérios persas e de muitas coisas da
filosofia grega no cristianismo primitivo, foram cometidos dois grandes erros:
p1670:4 149:2.31. O esforço por conectar diretamente o ensinamento do
evangelho com a teologia judaica, tal como ilustrado nas doutrinas cristãs da
expiação -o ensinamento de que Jesus era o Filho sacrificado que satisfaria a
justiça inflexível do Pai e aplacaria a ira divina. Estes ensinamentos se
originaram do esforço louvável por tornar mais aceitável o evangelho do reino
para os judeus incrédulos. Ainda que estes esforços fracassaram até onde era
envolvida a conquista dos judeus, eles não deixaram de confundir e de desviar
muitas almas honestas de todas as gerações posteriores.
p1670:5
149:2.42. O segundo grande desatino dos primeiros seguidores do Mestre, um erro
que todas as gerações posteriores têm persistido em perpetuar, foi o de
organizar tão completamente a doutrina cristã acerca da pessoa de Jesus. Esta
ênfase exagerada sobre a personalidade de Jesus na teologia do cristianismo,
contribuiu para obscurecer seus ensinamentos, e tudo isto fez cada vez mais
difícil para os judeus, os maometanos, os hindus e outras religiosos aceitarem
os ensinamentos de Jesus. Nós não queremos subestimar o lugar da personalidade
de Jesus na religião que talvez leve seu nome, mas tampouco permitiríamos que
esta consideração eclipse sua vida inspiradora ou suplante sua mensagem
salvadora: a paternidade de Deus e a fraternidade dos homens.
p1670:6
149:2.5 Os instrutores da religião de Jesus deveriam se aproximar de outras
religiões com o reconhecimento das verdades que têm em comum (muitas das quais
vêm direta ou indiretamente da mensagem de Jesus) abstendo-se ao mesmo tempo de
pôr tanta ênfase nas diferenças.
p1671:1 149:2.6 Naquele momento em
particular, a fama de Jesus baseava-se principalmente em sua reputação como
sanador, mas isto não significa que continuaria assim até o final. À medida que
o tempo passava, ele era mais e mais procurado por ajuda espiritual. Mas eram as
curas físicas as que exerciam o apelo mais direto e imediato sobre o povo comum.
Jesus era procurado cada vez mais pelas vítimas da escravidão moral e da
perturbação mental, e ele ensinava invariavelmente o caminho da libertação. Os
pais buscavam seu conselho sobre a maneira de controlar seus filhos, e as mães
vinham por ajuda na instrução de suas filhas. Os que estavam nas trevas acudiam
a ele, e ele lhes revelava a luz da vida. Seus ouvidos estavam sempre abertos às
dores da humanidade, e ele sempre ajudava aos que buscavam seu ministério.
p1671:2 149:2.7 Quando o mesmo Criador estava na Terra, encarnado na
semelhança da carne mortal, era inevitável que acontecessem algumas coisas
extraordinárias. Mas vós nunca deveríeis se aproximar de Jesus por causa destas
ocorrências chamadas milagrosas. Aprendei a vos aproximardes do milagre através
de Jesus, mas não cometais o erro de vos aproximardes de Jesus por causa dos
milagres. E esta recomendação está assegurada, apesar de Jesus de Nazaré ser o
único fundador de uma religião que realizara atos supra-materiais na Terra.
p1671:3 149:2.8 O traço mais surpreendente e mais revolucionário da
missão de Miguel na Terra foi sua atitude para com as mulheres. Numa época e
geração em que um homem não devia saudar em um lugar público nem sequer a sua
própria esposa, Jesus se atreveu a levar mulheres consigo como instrutoras do
evangelho na sua terceira excursão pela Galiléia. E ele teve a coragem consumada
de fazer isso a despeito do ensinamento rabínico que proclamava que «seria
melhor que as palavras da lei fossem queimadas do que entregues às mulheres.»
p1671:4 149:2.9 Em uma única geração, Jesus retirou as mulheres do
esquecimento desrespeitoso e das fainas servis de todas as idades. E é uma coisa
vergonhosa para a religião que se atreveu a levar o nome de Jesus, tamanha falta
de coragem moral de seguir este nobre exemplo em sua atitude posterior para com
as mulheres.
p1671:5 149:2.10 Quando Jesus se misturava com o povo, eles
o encontravam completamente livre das superstições daquela época. Estava livre
de preconceitos religiosos; ele nunca era intolerante. Não havia nada em seu
coração que se parecesse ao antagonismo social. Ainda que ele consentia com o
que havia de bom na religião de seus antepassados, não hesitava em negligenciar
as tradições supersticiosas e escravizantes inventadas pelo homem. Ele se
atreveu a ensinar que as catástrofes da natureza, os acidentes do tempo e outros
acontecimentos calamitosos não são provações do juízo divino nem disposições
misteriosas da Providência. Denunciou a devoção servil às cerimônias sem sentido
e mostrou a falácia do culto materialista. Proclamou audazmente a liberdade
espiritual do homem e ousou ensinar que os mortais de carne são de fato e em
verdade, filhos do Deus vivo.
p1671:6 149:2.11 Jesus transcendeu todos
os ensinamentos de seus antepassados quando substituiu audazmente as mãos limpas
pelos corações puros como o sinal da verdadeira religião. Estabeleceu a
realidade no lugar da tradição e varreu todas as pretensões da vaidade e da
hipocrisia. E entretanto, este intrépido homem de Deus não deu vazão às críticas
destrutivas nem manifestou um total desdém pelos costumes religiosos, sociais,
econômicos e políticos de sua época. Ele não era um revolucionário militante;
era um evolucionista progressista. Ocupava-se somente na destruição daquilo que
existia quando oferecia simultaneamente a seus semelhantes a coisa superior que
devia existir.
1672:1 149:2.12 Jesus obtinha obediência de seus
seguidores sem exigi-la. Apenas três homens que receberam seu chamamento
pessoal, recusaram aceitar este convite ao discipulado. Ele exercia um poder de
atração peculiar sobre os homens, mas não era ditatorial. Inspirava confiança, e
ninguém jamais ressentiu-se por ele dar uma ordem. Possuía uma autoridade
absoluta sobre seus discípulos, mas ninguém jamais se objetou. Ele permitia que
seus seguidores lhe chamassem de Mestre.
p1672:2 149:2.13 O Mestre era
admirado por todos os que se encontravam com ele, exceto por aqueles que
entretinham preconceitos religiosos profundamente arraigados ou os que
acreditavam discernir um perigo político em seus ensinamentos. Os homens ficavam
surpresos pela originalidade e a autoridade de seu ensinamento. Maravilhavam-se
por sua paciência ao tratar com os atrasados e os impertinentes inquiridores.
Inspirava esperança e confiança no coração de todos os que recebiam seu
ministério. Apenas os que não o conheciam o temiam, e ele era detestado somente
por aqueles que o consideravam como o defensor daquelas verdades que eram
destinadas a destruir o mal e o erro que eles haviam decidido manter a todo
custo em seus corações.
p1672:3 149:2.14 Ele exercia uma influência
poderosa e particularmente fascinante tanto sobre seus amigos como sobre seus
inimigos. As multidões o seguiam durante semanas, unicamente para escutar suas
palavras graciosas e para observar sua vida simples. Os homens e as mulheres
leais amavam a Jesus com um afeto quase supra-humano. E quanto melhor o
conheciam, tanto mais o amavam. E tudo isto ainda é verdade; inclusive hoje e em
todas as idades futuras, quanto mais o homem venha a conhecer este Deus-homem,
mais o amará e logo o seguirá.
A Hostilidade dos Líderes Religiosos
p1672:4 149:3.1 Apesar da favorável recepção de Jesus e de seus
ensinamentos pelo povo comum, os líderes religiosos de Jerusalém estavam cada
vez mais alarmados e hostis. Os fariseus haviam formulado uma teologia
sistemática e dogmática. Jesus era um instrutor que ensinava conforme se
apresentava a ocasião; não era um educador sistemático. Jesus não ensinava tanto
pela lei quanto a partir da vida, por parábolas. (E quando empregava uma
parábola para ilustrar sua mensagem, pretendia utilizar uma só caraterística da
história para essa finalidade. Muitas idéias erradas sobre os sobre os
ensinamentos de Jesus podem ser obtidos pela tentativa de transformar suas
parábolas em alegorias.)
p1672:5 149:3.2 Os chefes religiosos de
Jerusalém estavam ficando quase frenéticos como resultado da recente conversão
do jovem Abraão e da deserção dos três espiões, que haviam sido batizados por
Pedro, e que agora estavam até o fim com os evangelistas nesta segunda excursão
de predicação pela Galiléia. Os dirigentes judeus estavam cada vez mais cegados
pelo medo e preconceitos, enquanto seus corações tornavam-se duros pela rejeição
contínua das atraentes verdades do evangelho do reino. Quando os homens se
fecham ao chamamento do espírito que reside neles, é pouco o que pode ser feito
para modificar sua atitude.
p1672:6 149:3.3 Quando Jesus reuniu-se pela
primeira vez com os evangelistas no acampamento de Betsáida, ao terminar seu
discurso, disse: «Vós deveis recordar que tanto no corpo como na mente
-emocionalmente- os homens reagem individualmente. A única coisa uniforme a
respeito dos homens é o espírito interior. Ainda que os espíritos divinos possam
variar um pouco na natureza e na extensão de sua experiência, eles reagem
uniformemente a todas os apelos espirituais. Somente através do e pelo apelo a
este espírito, a humanidade poderá alcançar a unidade e a fraternidade.» Mas
muitos líderes dos judeus haviam fechado as portas de seus corações ao
chamamento espiritual do evangelho. A partir deste dia, eles não pararam de
fazer planos e de conspirar para a destruição do Mestre. Eles estavam
convencidos que Jesus tinha que ser detido, condenado e executado como um
infrator religioso, um violador dos ensinamentos cardinais da sagrada lei
judaica.
O Desenrolar da Excursão de Predicação
p1673:1 149:4.1 Jesus fez muito pouco trabalho público nesta
excursão de predicação, mas dirigiu muitas aulas vespertinas para os crentes na
maioria das cidades e povoados onde teve chance de passar uma temporada com
Tiago e João. Numa destas sessões vespertinas, um dos evangelistas mais jovens
fez uma pergunta a Jesus sobre a ira, e o Mestre, entre outras coisas, disse em
resposta:
p1673:2 149:4.2 «A ira é uma manifestação material que
representa, de uma maneira geral, a medida do fracasso da natureza espiritual em
conseguir dominar as naturezas intelectual e física combinadas. A ira indica
vossa falta de amor fraternal tolerante mais a vossa falta de respeito próprio e
de autocontrole. A ira esgota a saúde, degrada a mente, e põe obstáculos ao
instrutor espiritual da alma do homem. Não lestes nas Escrituras que `a ira mata
o homem néscio' e que o homem `se dilacera a si mesmo em sua ira'? Que `o que é
lento em encolerizar-se possui uma grande compreensão,' enquanto `o que é
impaciente de temperamento exalta a insensatez'? Todos vós sabeis que `uma
resposta doce desvia a cólera,' e como `as palavras ásperas despertam a raiva.'
`A discrição defere a cólera' enquanto `o que não tem controle sobre si próprio
é como uma cidade sem defesa e sem muralhas.' `A ira é cruel e a cólera é
ultrajante.' `Os homens irados incitam a disputa, enquanto os furiosos
multiplicam suas transgressões.' `Não sejais impacienteS de espírito, porque a
cólera repousa no seio dos néscios.'» Antes de Jesus terminar de falar, disse
ademais: «Que vosso coração esteja tão dominado pelo amor, que vosso guia
espiritual tenha poucas dificuldades para livrá-los da tendência de dar vazão a
esses arroubos de ira animal que são incompatíveis com o estado de filiação
divina.»
p1673:3 149:4.3 Nesta mesma ocasião, o Mestre falou ao grupo
sobre a conveniência de possuir um caráter bem equilibrado. Reconheceu que era
necessário para a maioria dos homens dedicarem-se ao domínio de alguma vocação,
mas ele deplorava toda tendência à especialização excessiva, a tornarem-se
limitados de visão e circunscritos nas atividades da vida. Ele chamou a atenção
para o fato de que toda virtude, se levada ao extremo, pode tornar-se um vício.
Jesus sempre pregou a moderação e ensinou a consistência -o ajustamento
proporcionado dos problemas da vida. Ele assinalou que um excesso de compaixão e
piedade pode degenerar em uma grave instabilidade emocional; que o entusiasmo
pode levar ao fanatismo. Falou sobre um de seus antigos associados, cuja
imaginação o havia levado a empresas visionárias e impraticáveis. Ao mesmo
tempo, os advertiu contra os perigos da monotonia de uma mediocridade demasiado
conservadora.
p1673:4 149:4.4 E então, Jesus discorreu sobre os perigos
da coragem e da fé, de como elas algumas vezes levam às almas irrefletidas à
imprudência e à presunção. Ele também mostrou como a prudência e a discrição,
quando levadas longe demais, conduzem à covardia e ao fracasso. Exortou a seus
ouvintes a que aspirassem a originalidade, enquanto evitassem toda tendência à
excentricidade. Defendeu uma simpatia sem sentimentalismo, uma piedade sem
hipocrisia. Ensinou a reverência livre do medo e da superstição.
p1674:1
149:4.5 O que impressionava a seus companheiros não era tanto o que Jesus
ensinava sobre o caráter equilibrado, quanto o fato de que sua própria vida era
uma ilustração tão eloqüente de seu ensinamento. Ele viveu em meio a tensão e a
tempestade, mas nunca vacilou. Seus inimigos traçaram armadilhas continuamente,
mas eles nunca o capturaram. Os sábios e os eruditos tentaram enganá-lo, mas ele
não tropeçou. Procuraram embaraçá-lo nos debates, mas suas respostas eram sempre
esclarecedoras, dignas e definitivas. Quando ele era interrompido em seus
discursos com múltiplas perguntas, suas respostas eram sempre significativas e
conclusivas. Nunca recorreu a táticas indignas para enfrentar à contínua pressão
de seus inimigos, que não hesitavam em empregar toda espécie de falsas, injustas
e iníquas formas de ataques contra ele.
p1674:2 149:4.6 Ainda que seja
verdade que muitos homens e mulheres devem se aplicar assiduamente em alguma
ocupação determinada como uma profissão de sustento, entretanto é inteiramente
desejável que os seres humanos cultivem uma ampla gama de conhecimentos
culturais sobre a vida tal como é vivida na Terra. As pessoas realmente
instruídas não ficam satisfeitas em permanecer na ignorância sobre a vida e as
atividades de seus semelhantes.
A Lição Sobre o Contentamento
p1674:3 149:5.1 Quando Jesus estava visitando o grupo de
evangelistas que trabalhava sob a supervisão de Simão o Zelote, durante a
reunião noturna Simão perguntou ao Mestre: «Por que algumas pessoas estão muito
mais felizes e contentes que outras? O contentamento é um assunto de experiência
religiosa?» Em resposta à pergunta de Simão, Jesus disse entre outras coisas:
p1674:4 149:5.2 «Simão, algumas pessoas são naturalmente mais felizes
que outras. Muita coisa, muita coisa mesmo, depende da boa vontade do homem ser
conduzido e dirigido pelo espírito do Pai que vive dentro dele. Não leste nas
Escrituras as palavras do sábio, `O espírito do homem é a vela do Senhor que
examina todo seu interior'? E também que estes mortais conduzidos assim pelo
espírito dizem: `As cordas são deixadas para mim em lugares confortáveis; sim,
eu tenho uma bela herança.' `O pouco que um homem justo possui é melhor que as
riquezas de muitos malvados,' porque `um homem bom estará satisfeito a partir de
dentro de si mesmo.' `Um coração alegre produz um semblante jovial e é uma festa
contínua. É melhor um pouco com a reverência do Senhor, do que um grande tesouro
e seus problemas. É melhor uma refeição de ervas em que há amor, do que um boi
corpulento e com seu ódio. É melhor um pouco com justiça, do que grandes
rendimentos sem retitude.' `Um coração alegre faz bem como um remédio.' `É
melhor um punhado com serenidade, do que uma superabundância com dores e
tormento de espírito.'
p1674:5 149:5.3 «Grande parte dos sofrimentos do
homem nasce da decepção de suas ambições e das mágoas a seu orgulho. Ainda que
os homens têm uma obrigação para si mesmos de fazerem o melhor de suas vidas na
Terra, tendo assim se esforçado sinceramente, eles deveriam aceitar alegremente
sua sorte e usufruir da engenhosidade para produzir o máximo daquilo que tiver
caído em suas mãos. Muitíssimas dificuldades dos homens originam-se no medo sujo
natural de seu próprio coração. `O perverso foge quando ninguém o persiga.' `Os
perversos são como o mar agitado, pois não pode descansar, mas suas águas jogam
lama e lodo; não há paz, diz Deus, para os perversos.'
p1674:6 149:5.4
«Não busqueis, pois, uma falsa paz e uma alegria passageira, mas sim a segurança
da fé e as garantias da filiação divina, que dão a serenidade, o contentamento e
a alegria suprema no espírito.»
p1675:1 149:5.5 Jesus quase não
considerava este mundo como um «vale de lágrimas.» Ele ao invés, estimava-o como
a esfera de nascimento dos espíritos eternos e imortais de ascensão ao Paraíso,
«o vale da criação das almas».
O "Medo do Senhor"
p1675:2 149:6.1 Foi em Gamala, durante a reunião vespertina,
que Felipe disse a Jesus: «Mestre, por que será que as Escrituras nos ensinam a
`temer ao Senhor,' enquanto que tu desejarias que olhemos sem medo ao Pai que
está nos céus? Como harmonizaremos estes ensinamentos?» E Jesus respondeu a
Felipe, dizendo:
p1675:3 149:6.2 «Meus filhos, não fico surpreso que vós
me façais estas perguntas. No princípio, era apenas através do medo que o homem
conseguia aprender a reverência, mas eu vim para revelar o amor do Pai de forma
que vós ficareis interessados a adorar ao Eterno pela atração do reconhecimento
afetuoso de um filho, e a reciprocidade do amor profundo e perfeito do Pai. Eu
queria livrá-los da escravidão de vos dirigir, por medo servil, ao serviço
tedioso de um Deus-Rei ciumento e colérico. Queria vos instruir na relação
Pai-filho de Deus e o homem, para que vós possais ser conduzidos alegremente à
livre adoração, sublime e celeste, de um Pai-Deus amoroso, justo e
misericordioso.
p1675:4 149:6.3 «O `medo do Senhor' tem tido diferentes
significados durante as sucessivas gerações, começando com o medo, passando pela
angústia e o terror, até o pavor e a reverência. E agora, a partir da
reverência, eu quero conduzi-los, através do reconhecimento, da compreensão e da
apreciação, até o amor. Quando o homem reconhece somente as obras de Deus, ele é
induzido a temer ao Supremo; mas quando o homem começa a compreender e a
experimentar a personalidade e o caráter do Deus vivo, é induzido a amar cada
vez mais este bom e perfeito Pai universal e eterno. E é justamente esta mudança
na relação do homem para com Deus que constitui a missão do Filho do Homem na
Terra.
p1675:5 149:6.4 «Os filhos inteligentes não temem a seu pai afim
de que eles possam receber bons presentes de suas mãos; mas tendo já recebido a
fartura das boas coisas outorgadas pelos ditames do afeto do pai por seus filhos
e filhas, estes filhos muito amados são induzidos a amar a seu pai em resposta
ao reconhecimento e à apreciação de tão generosa beneficência. A bondade de Deus
leva ao arrependimento; a beneficência de Deus conduz ao serviço; a misericórdia
de Deus conduz à salvação; enquanto que o amor de Deus conduz à adoração
inteligente e generosa.
p1675:6 149:6.5 «Vossos antepassados temiam a
Deus porque ele era poderoso e misterioso. Vós o adorareis porque ele é
magnífico em amor, abundante em misericórdia e glorioso em verdade. O poder de
Deus engendra o medo no coração do homem, mas a nobreza e a retitude de sua
personalidade geram a reverência, o amor e a adoração voluntária. Um filho
obediente e carinhoso não receia nem teme inclusive a um poderoso e nobre pai.
Eu vim ao mundo para estabelecer o amor no lugar do medo, a alegria no lugar da
tristeza, a confiança no lugar do temor, o serviço amante e a adoração
agradecida no lugar da escravidão servil e das cerimônias sem significado. Mas
ainda é verdade para os que estão nas trevas que `o medo do Senhor é o começo da
sabedoria'. Mas quando a luz tiver chegado mais completamente, os filhos de Deus
serão induzidos a louvar o Infinito pelo que ele é, em lugar de temê-lo pelo que
ele faz.
p1675:7 149:6.6 «Quando os filhos são jovens e irrefletidos,
eles necessariamente devem ser repreendidos para que honrem a seus pais; mas
quando envelhecem e tornam-se um pouco mais agradecidos pelos benefícios
paternos do ministério e da proteção, eles são levados, através do respeito
compreensivo e do afeto crescente, a esse nível de experiência onde amam
realmente a seus pais pelo que são, mais do que pelo fizeram. O pai ama
naturalmente seu filho, mas o filho deve desenvolver seu amor pelo pai, a partir
do medo do que o pai pode fazer, através do temor, do terror, da dependência e
da reverência, até a consideração agradecida e carinhosa do amor. p1676:1
149:6.7 «Vós fostes ensinados que deveis `temer a Deus e guardar seus
mandamentos, porque é o inteiro dever do homem.' Mas eu vim para vos dar um
mandamento novo e superior. Eu quero vos ensinar a `amar a Deus e a aprender a
fazer sua vontade, porque este é o privilegio mais elevado dos filhos libertos
de Deus.' Vossos pais foram ensinados a `temer a Deus -ao Rei Todo-poderoso.' Eu
vos ensino, `Amai a Deus -ao Pai totalmente misericordioso.'
p1676:2
149:6.8 «No reino dos céus, na qual vim proclamar, não existe um rei superior e
poderoso; este reino é uma família divina. O centro e o chefe, universalmente
reconhecido e adorado sem reservas, desta extensa fraternidade de seres
inteligentes, é meu Pai e vosso Pai. Eu sou seu Filho, e vós também sois seus
filhos. Consequentemente é eternamente verdade que vós e eu somos irmãos no
estado celestial, e tudo o mais desde que nos tornamos irmãos na carne da vida
terrestre. Deixai, pois, de temer a Deus como a um rei ou de servi-lo como a um
senhor; aprendei a reverenciá-lo como o Criador; a honrá-lo como o Pai de vossa
juventude espiritual; a amá-lo como um defensor misericordioso; e finalmente, a
adorá-lo como o Pai amoroso e todo-sábio de vossa compreensão e apreciação
espirituais mais maduras.
p1676:3 149:6.9 «Dentre os vossos conceitos
errôneos do Pai que está nos céus crescem vossas idéias falsas sobre a humildade
e surge uma grande parte de vossa hipocrisia. O homem pode ser um verme da terra
por sua natureza e origem, mas quando está habitado pelo espírito de meu Pai,
esse homem torna-se divino em seu destino. O espírito efundido do meu Pai
regressará com toda segurança à fonte divina e ao nível universal de origem, e a
alma humana do homem mortal, que se tornará a filha renascida deste espírito
interior, ascenderá certamente com o espírito divino até a presença mesma do Pai
eterno.
p1676:4 149:6.10 «Em verdade, a humildade convém o homem mortal
que recebe todos estes dons do Pai que está nos céus, embora haja uma dignidade
divina ligada a todos estes candidatos da fé, à ascensão eterna do reino
celestial. As práticas sem sentido e servis de uma humildade ostentosa e falsa
são incompatíveis com a apreciação do origem de vossa salvação e com o
reconhecimento do destino de vossas almas nascidas do espírito. A humildade
perante Deus é totalmente apropriada no fundo de vossos corações; a mansidão
diante dos homens é recomendável; mas a hipocrisia de uma humildade
autoconsciente e desejosa de chamar a atenção é infantil e indigna dos filhos
iluminados do reino.
p1676:5 149:6.11 «Fazeis bem em ser dóceis diante
de Deus e controlados diante dos homens, mas que vossa mansidão seja de origem
espiritual, e não a exibição autoilusória de um sentido consciente de
superioridade hipócrita. O profeta falou prudentemente quando disse, `Caminhai
humildemente com Deus' porque, ainda que o Pai celestial é o Infinito e o
Eterno, ele também habita `com aquele que é de mente contrita e um espírito
humilde.' Meu Pai despreza o orgulho, detesta a hipocrisia, e abomina a
iniquidade. E foi para enfatizar o valor da sinceridade e a confiança perfeita
no sustento amoroso e no guia fiel do Pai celestial, que tenho me referido tão
freqüentemente às crianças, como demonstrativo da atitude mental e a reação
espiritual que são tão essenciais para o ingresso do homem mortal nas realidades
espirituais do reino dos céus.
p1677:1 149:6.12 «O profeta Jeremias
descreveu bem a muitos mortais quando disse: `Vós estais próximos a Deus na
boca, mas longe dele no coração.' E não lestes também aquela terrível
advertência do profeta que disse: `Seus sacerdotes ensinam por um salário e seus
profetas adivinham por dinheiro. Ao mesmo tempo, eles manifestam piedade e
proclamam que o Senhor está com eles'. Vós não fostes bem advertidos contra
aqueles que `falam de paz a seus vizinhos, enquanto a maldade está em seus
corações', contra os que `bajulam com os lábios, enquanto o coração é dado à
hipocrisia'? De todas as dores de um homem confiado, nenhuma é mais terrível que
a de ser `ferido na casa de um amigo confiável.'»
O Regresso à Betsáida
p1677:2 149:7.1 André, em consulta com Simão Pedro e com a
aprovação de Jesus, instruíra a Davi, em Betsáida, que enviasse mensageiros aos
diversos grupos de predicadores com as ordens de que terminassem a excursão e
voltassem a Betsáida a qualquer hora de quinta-feira, 30 de dezembro. Na hora do
jantar neste dia chuvoso, todo o grupo apostólico e os educadores evangelistas
haviam chegado à casa de Zebedeu.
p1677:3 149:7.2 O grupo permaneceu
reunido até o sábado, ficando acomodados nos lares de Betsáida e da vizinha
Cafarnaum, depois do qual foi concedido a todo o grupo umas duas semanas de
recesso para ir em casa para suas famílias, visitar seus amigos ou ir pescar. Os
dois ou três dias que eles ficaram juntos em Betsáida foram verdadeiramente
regozijantes e inspiradores; inclusive os educadores mais antigos ficaram
edificados com os jovens predicadores à medida que relatavam suas experiências.
p1677:4 149:7.3 Dos 117 evangelistas que participaram nesta segunda
excursão de predicação pela Galiléia, somente cerca de setenta e cinco
sobreviveram à prova da experiência real, e estiveram disponíveis para serem
designados ao serviço no final das duas semanas de descanso. Jesus, permaneceu
na casa de Zebedeu com André, Pedro, Tiago e João, e passou muito tempo em
reunião com eles sobre o bem-estar e a expansão do reino.
Tradução Voluntária Por : Heitor Carestiato Neto