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Quando as coisas vão mal

Quando nos sentimos culpados

Por Harry McMullan, III
tradução em português por Ana Maria Nascimento Roberto


Quando nos comportamos mal, a culpa espelha a transgressão de nossa própria regra moral. Tal como a dor nos avisa que uma lasca penetrou profundamente em nossa carne, a culpa reclama uma pausa no que quer de errado que estejamos cometendo por criar uma terrível sensação de falta perante Deus e de separação dos nossos entes amados. A dor física diminui uma vez que a lasca tenha sido removida mas a culpa pode debilitar-nos até anos após o pensamento ou ato que lhe deram origem. Essa culpa traiçoeira deve ser simplesmente encerrada, abandonada, esquecida, proibida de entrar pelos portões de nossa mente. Tendo cumprido com seu objetivo, tendo entregue sua inoportuna mensagem relativa ao nosso comportamento inaceitável, se o mensageiro da culpa se recusa a desaparecer ante o raiar do perdão do Pai, ela deve ser energicamente expulsa por todos os que almejam a paz.

Todos conhecemos a escuridão espantosa que cerca a alma em culpa. Experimentamos a culpa quando sabemos que fizemos mal mas também nos sentimos como se tivéssemos culpa quando não aderimos aos costumes sociais que não têm apoio algum na lealdade espiritual. Por exemplo, freqüentar regularmente o serviço religioso, a missa ou a sinagoga não tem nada a ver com o pecado, independente das sanções que estas atividades podem ter dentro de suas respectivas comunidades. A culpa imposta com relação a tais assuntos deve ser simplesmente rejeitada. Jesus veio ao nosso mundo proclamando a liberdade espiritual e a retidão baseada exclusivamente na cooperação e confiança em Deus, a vontade de Deus, e isto deve ter primazia sobre a obediência à hábitos e observâncias humanas. Jesus demonstrou um Deus perdoador, um Deus que é incapaz de estimular a culpa numa relação Pai-filho.

Colocar as coisas em perspectiva abranda a agonia da culpa. Quem é que de fato vive a luz de sua vida ideal? O pecado acidental é inevitável, o resultado natural de Deus ter-nos feito livres mas ainda imaturos; faz parte do ser humano. O importante é reparar rapidamente o erro que deu origem à culpa, aprender efetivamente com ele e vigiar mais para não repeti-lo no futuro.

Em caso de desvio deliberado do que sabemos que é correto, a cura fácil é a confissão e o arrependimento somados ao desejo sincero de nunca mais errar assim. Buscar o perdão deste modo faz abrir as comportas de perdão do Pai, em ondas que saram nossa alma. Pecados ignorados ulceram no recesso de nossa mente mas, desde que sinceramente confrontados e confessados, Deus os elimina para sempre; portanto, devemos reunir coragem para perdoar a nós mesmos. Relembrar nossas faltas somente aumenta seu poder. De preferência, devemos repudiá-las pois o passado acabou-se. Deus nos fez inteiros, prontos para marchar desimpedidos rumo aos desafios da vida futura.

Às vezes não podemos aceitar que o Pai nos perdoou e continuamos a nos chafurdar na auto-reprovação. Aqui, o problema pode não ser a falta de arrependimento mas sim a falta de conhecimento da compreensão e da natureza perdoadora de Deus. Os que vêem a Deus como um juiz severo têm grande dificuldade com a culpa. Todos nós cometemos faltas, cada um de nós, e à parte de nosso entendimento sobre a aceitação do Pai, que é própria de pai, a culpa se retarda como uma condição contínua, envenenando nossa vida espiritual e nos roubando a alegria.

O sentimento de culpa por omissão é talvez a mais difícil variedade de se tratar pois nossos ideais expandem-se mais rápido que nossa habilidade de viver neles. Com respeito a essa culpa, devemos nos lembrar de que o Pai criou o homem mortal completamente imaturo e este fato nos impede de viver uma vida perfeita na terra. E não poderia ser de outra maneira. Sendo humanos, devemos perseguir o que é superior mas sem nos incomodarmos seriamente pelas faltas constantemente cometidas contra os objetivos que nossa percepção espiritual em expansão identifica com a perfeita vontade de Deus. Nosso Pai está tranqüilo com nosso passado e nós também deveríamos estar, confiantes em sua habilidade de construir sobre ele nossa estrada para a perfeição.

Não é desejo do Pai que seus filhos vivam sentindo-se culpados. A culpa não é nada mais que um útil marcador para lembrar nossa alma de que é necessário melhorar o comportamento e atitudes. Contudo, entregar-se à ela nos incomoda e nos debilita, impedindo nossa jornada espiritual em direção àquele estado espiritual no qual o pecado se torna impossível — a fusão de nossa alma com a do Modelador interior proveniente do Pai.

Tudo o que temos que fazer é nos esforçarmos sinceramente para viver conforme a luz de nosso entendimento espiritual, não permitindo que nenhum pecado consciente exista em nossa vida. Pecados irrefletidos são lapsos momentâneos que não têm nenhum impacto na vida espiritual, mas o pecado repetido é um veneno para a alma que deve ser erradicado se não desejamos regredir. Para estarmos limpos por dentro, evitamos todo pecado contínuo por meio do poder de nosso relacionamento com Deus, cujo júbilo faz com que seja cada mais improvável uma separação. O Pai cuidará de tudo o mais. Esse Pai nos ama supremamente, vê o que podemos vir a ser, e trabalha para nos ajudar a consumarmos o destino que ele estabeleceu para nós antes que os mundos tivessem origem.

 

 

Deus é divinamente bondoso com os pecadores. Quando os rebeldes volvem à retitude, são misericordiosamente recebidos, "pois nosso Deus é rico em perdão". "Eu sou o que apaga as tuas transgressões por amor de mim, e já não me lembro dos teus pecados". "Vede que prova de amor nos deu o Pai : que sejamos chamados filhos de Deus". (2:5.4)

Em todo mortal existe uma natureza dual : a herança da tendência animal e o impulso superior da dotação espiritual. Durante a curta vida que viveis em Urantia, estes dois impulsos distintos e opostos raramente podem ser completamente conciliados; dificilmente podem ser harmonizados e unificados; porém, ao longo de vossa vida, o Espírito combinado sempre ministra auxiliando a subjugar a carne cada vez mais à direção do Espírito. Mesmo que devas viver tua vida material do princípio ao fim, mesmo que não possas esquivar-te do corpo e suas necessidades, todavia, em propósito e ideais estás cada vez mais dotado para submeter a natureza animal ao comando do Espírito. Verdadeiramente existe em ti uma conspiração de forças espirituais, uma união de divinos poderes cujo propósito exclusivo é efetuar tua derradeira libertação da escravidão material e dos obstáculos finitos. (34:6.9)

Os estímulos normais aos seres animais e os apetites e impulsos peculiares à natureza física não estão em conflito nem mesmo com as mais altas realizações espirituais, exceto na mente das pessoas ignorantes, mal instruídas ou, infelizmente, extremamente escrupulosas. (34:7.7)

A sensação de culpa (não a consciência do pecado) vem de se interromper uma comunhão espiritual ou de se reduzir os ideais morais. A libertação de tal estado somente pode vir através de se perceber que os mais elevados ideais morais não são necessariamente sinônimos da vontade de Deus. O homem não pode esperar viver de acordo com seus mais elevados ideais, mas pode ser fiel ao seu propósito de encontrar a Deus e de vir a ser cada vez mais como ele. (103:4.3)

Mas nem sempre podemos nos fiar na interpretação destes antigos conflitos entre a vontade-do-ego e a vontade-de-outro-que-não-o-ego. Tão só uma personalidade completamente unificada pode arbitrar as multiformes disputas entre os desejos do ego e a florescente consciência social. O ego tem direitos tal qual os do próximo. Nenhum dos dois irá reivindicar atenção e serviço exclusivo da pessoa. A falha em resolver este problema dá origem ao mais antigo tipo de sentimento humano de culpa. (103:5:4)

Jesus disse : "Meu amigo, todos somos Jonas, com vidas para viver de acordo com a vontade de Deus e todas as vezes que buscamos escapar ao presente dever de viver, fugindo para atrações distantes, colocamo-nos desse modo sob o controle imediato de influências que não são dirigidas pelos poderes da verdade nem pelas forças da retitude. Fugir ao dever é sacrificar a verdade. Esquivar-se do serviço da luz e da vida só pode resultar nos penosos conflitos com os colossos de egoísmo que terminar por conduzir à escuridão e à morte a menos que estes Jonas que abandonaram a Deus, mesmo estando no mais profundo desespero, dirijam seu coração rumo à procura por Deus e sua bondade. E quando tais almas abatidas buscam sinceramente por Deus — famintas da verdade e sedentas da retitude — não há nada que possa retê-las mais no cativeiro. Não importa quão grandes sejam as profundezas em que tenham caído; quando buscam a luz com todo o coração, o Espírito do Senhor Deus do céu as liberta de seu cativeiro, as circunstâncias malignas da vida as lançarão à terra firme de novas oportunidades para o serviço renovado e uma vida mais judiciosa." (130:1.2)

A mente humana não suporta bem o conflito da dupla lealdade. É extenuante para a alma passar pela experiência de esforçar-se para servir ao bem e ao mal. A mente supremamente feliz e eficientemente unificada é aquela completamente dedicada a fazer a vontade do Pai Celestial. Os conflitos não resolvidos destroem a unidade e podem findar na ruptura da mente. Mas não se fomenta o caráter de sobrevivência da alma tentando-se assegurar a paz mental a qualquer preço, abandonando aspirações nobres ou comprometendo ideais espirituais; mais propriamente, tal paz se alcança pela afirmação inquebrantável de triunfo do que é verdadeiro e esta vitória se consegue vencendo-se o mal com a poderosa força do bem. (133:7.12)

Os três apóstolos ficaram comovidos aquela tarde quando perceberam que a religião de seu Mestre não prescrevia o auto-exame de consciência espiritual...Mas nada disse que condenasse a auto-análise como prevenção do egotismo jactancioso. (140:8.27)

Mesmo o perdão dos pecados opera desta mesma forma infalível. O Pai no céu tem perdoado a ti antes mesmo de haveres pensado em pedi-lo, mas tal perdão não é acessível em tua experiência religiosa pessoal até o momento em que perdoardes aos teus semelhantes. De fato, o perdão de Deus não depende de perdoardes aos semelhantes mas, na vivência, depende exatamente disto. (146:2.4)

Jesus compreendia plenamente quão difícil é para os homens romper com seu passado. Sabia como os seres humanos são influenciados pela eloqüência dos pregadores e como a consciência humana responde ao apelo emocional assim como a mente responde à razão e à lógica; mas ele também sabia quão mais difícil é convencer o homem a deixar o passado. (154:6.8)

Não desanimeis ao descobrir que sois humanos. A natureza humana pode ter tendência ao mal, mas não é inerentemente pecaminosa. Não fiqueis deprimidos por vossa incapacidade de esquecer por completo algumas de vossas experiências mais lamentáveis. Os erros que não podeis esquecer no tempo serão esquecidos na eternidade. Aliviai a carga de vossa alma adquirindo depressa uma perspectiva mais ampla de vosso destino, uma expansão de vossa caminhada no universo. (156:5.8)

Num entardecer em Hipos, em resposta à pergunta de um discípulo, ensinou Jesus a lição do perdão. Disse o Mestre :

"Se um homem de bom coração tem cem ovelhas e uma delas se extravia, não deixa ele imediatamente as noventa e nove e sai em busca da que se extraviou? E se é um bom pastor, não insistirá na busca da ovelha perdida até encontrá-la? E então, ao encontrar sua ovelha perdida, coloca-a nos ombros e volta para casa rejubilante, chamando os amigos e vizinhos, "Regozijai-vos comigo pois encontrei minha ovelha que estava perdida." Declaro-vos que há mais alegria no céu por um pecador que se arrepende que por noventa e nove pessoas retas que não necessitam de arrependimento. Mesmo assim, não é desejo de Meu Pai no céu que se extravie um destes pequenos, muito menos que pereçam. É possível que em vossa religião Deus receba os pecadores; mas no evangelho do reino, o Pai sai a buscá-los mesmo antes que tenham pensado seriamente em se arrepender. (159:1.1-2)

Nunca hesites em admitir o fracasso. Não tentes de esconder o fracasso sob sorrisos simulados e otimismo radiante. Sempre cai bem alegar sucesso, mas os resultados finais são sempre atrozes. Tal prática leva diretamente à criação de um mundo de irrealidade e ao impacto inevitável da extrema desilusão.

"O perdão divino é inevitável; é inerente e inalienável à infinita compreensão de Deus, em seu perfeito conhecimento de tudo o que se relaciona com o juízo errôneo e a escolha equivocada do filho. A justiça divina é tão eternamente reta que infalivelmente inclui a misericórdia compreensiva" (174:1.3)